Nesta quarta-feira 2, completa-se um ano do pedido de vistas do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), na ação da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) que defende a inconstitucionalidade das doações de empresas em campanhas eleitorais. Na esteira da Operação Lava Jato, que investiga dezenas de políticos e empreiteiras por corrupção na Petrobras, o financiamento de campanha emergiu como um importante canal responsável por casos de corrupção.
Há um consenso de que o sistema atual é problemático, mas não ocorre o mesmo a respeito de como reformá-lo. O debate transcorre no Congresso e mudanças nas regras do financiamento de campanha podem ser feitas caso uma reforma política seja aprovada. Leia, abaixo, algumas perguntas e respostas sobre o tema.
O STF estava julgando a constitucionalidade das doações de campanha no Brasil. Como acabou o julgamento?
Ainda não acabou. Em 2014, o STF retomou a análise de uma ação da OAB na qual a entidade alega que as doações empresariais são inconstitucionais. Seis ministros (Luiz Fux, Luís Roberto Barroso, Dias Toffoli e Joaquim Barbosa, Marco Aurelio Mello e Ricardo Lewandowski) concordaram com a tese da OAB e um (Teori Zavascki) rejeitou a ação. Gilmar Mendes pediu vistas do processo, paralisando o julgamento. Até hoje ele não devolveu o processo, alegando que trata-se de uma matéria de responsabilidade do Congresso e não do Judiciário.
O julgamento no STF mudou alguma coisa no sistema de financiamento de campanha?
Por enquanto, não.
Como funciona o financiamento de campanha hoje no País?
No Brasil, adota-se o sistema misto de financiamento de campanha. Os partidos podem arrecadar dinheiro tanto por meio de doações de empresas quanto de pessoas físicas.
Há dinheiro público nas eleições brasileiras?
Sim. Os recursos públicos para os partidos políticos são distribuídos de duas formas. Por meio do Fundo Partidário e por meio da isenção fiscal para os canais de TV que veiculam o horário eleitoral. Entre 2002 e 2014, as emissoras de televisão e rádio receberam 4,4 bilhões de reais em isenções fiscais para transmitir os programas políticos.
O que é Fundo Partidário?
O Fundo Partidário é o dinheiro público que sustenta os partidos políticos. O argumento para sua existência é a importância dos partidos para o regime democrático. O fundo é abastecido majoritariamente com o dinheiro dos impostos pagos pelos contribuintes. O total varia a cada ano, pois depende do percentual de repasse estipulado pelo Congresso no Orçamento da União. Depende também de multas, penalidades, doações e outros recursos previstos pela legislação eleitoral. Em 2014 foram distribuídos 289,6 milhões de reais. O relator do Orçamento da União para 2015, o senador Romero Jucá (PMDB-RR), apresentou uma emenda triplicando os repasses para o Fundo Partidário em 2015. Com isso, os 32 partidos políticos com representação no Brasil receberiam até 867 milhões de reais neste ano.
Como funciona a distribuição do Fundo Partidário?
Por lei, 5% dos recursos do fundo são divididos, em partes iguais, entre todos os partidos. Os 95% restantes são distribuídos de forma proporcional aos votos obtidos na última eleição geral para a Câmara dos Deputados.
Atualmente, as empresas podem doar diretamente para um candidato?
Sim, as empresas podem doar, na mesma campanha eleitoral, para um ou mais partidos e também para candidatos individualmente. Isso permite que as empresas doem tanto para partidos de situação como de oposição, seja nos municípios, no estados ou no governo federal.
Qual foi a participação das empresas nas últimas eleições?
Nas eleições de 2014, as doações privadas contribuíram com 5 bilhões de reais a partidos e candidatos. Quase a totalidade destas doações foram feitas por empresas.
Para as empresas, é bom financiar campanhas políticas?
Sim. O estudo ‘The Spoils of Victory’, que examinou doações para candidatos do PT, é um exemplo. Realizada por três universidades dos Estados Unidos, a pesquisa concluiu que as empresas financiadoras dos candidatos a deputado federal do PT nas eleições de 2006 receberam entre 14 e 39 vezes o valor doado por meio de contratos com o poder público nos anos subsequentes. A pesquisa cruzou dados oficiais de doações para as campanhas e os contratos obtidos pelas empresas nos anos seguintes – sem levar em conta eventuais pagamentos ilegais.
Há ligação entre as doações empresariais e casos de corrupção?
Sim. Quase todos os grandes casos de corrupção do País envolvem doações de campanha. Contribuições deste tipo fizeram parte do caso que terminou com o impeachment do ex-presidente Fernando Collor, da CPI dos Anões do Orçamento, do chamado "mensalão" e da Operação Lava Jato e do escândalo envolvendo o senador Agripino Maia (DEM) no Rio Grande do Norte. Nas palavras de Paulo Roberto Costa, ex-diretor da Petrobras e delator da Lava Jato, não há doações legais no Brasil, mas sim "empréstimos a serem cobrados posteriormente a juros altos dos beneficiários das contribuições quando no exercício dos cargos".
No Brasil, há quem cogite acabar com as doações empresariais. Outros países fazem isso?
Segundo dados do Instituto Internacional pela Democracia e Assistência Eleitoral (Idea, na sigla em inglês), existe uma tendência mundial de aumento da restrição a doações empresariais. Ao todo, 39 países, como Portugal, França e Canadá, proíbem doações de empresas para políticos e partidos. Atualmente, além do Brasil, a Espanha também estuda adotar a restrição.
Proibir o financiamento empresarial de campanhas é efetivo para combater a corrupção?
Depende do sistema adotado. Os Estados Unidos, por exemplo, proíbem doações diretas de empresas, mas permitem que as companhias escolham e façam campanhas por seus candidatos. Por isso, na prática, a restrição não surte efeito. Para a maioria dos especialistas, somente leis mais firmes, aliadas com mais transparência governamental e com autonomia dos órgãos de investigação são capazes de inibir a prática corruptiva por agentes públicos.
Qual é a proposta de financiamento do PMDB?
O PMDB possui a relatoria da Comissão de Reforma Política na Câmara Federal, que entre outras reformas tratará do financiamento de campanha. A proposta do partido, defendida pelo presidente da Câmara Federal Eduardo Cunha (PMDB-RJ), consiste em manter o modelo de financiamento misto de campanha, mas com limites para as doações de empresas e regulando as doações de pessoas físicas. Entre as propostas defendidas pelo partido está o projeto de empresas ficarem restritas a doar recursos para apenas um partido, acabando com o “jogo sem perdedores”, no qual as empresas doam para todos os partidos.
E qual é a proposta do PSDB?
O PSDB defende o modelo misto de financiamento de campanha, conforme revelou o senador Aloysio Nunes no site da sigla.
E o PT, tem proposta?
O PT defende o fim das doações privadas e o financiamento 100% público de campanha.
Há algum país que adota a proposta de 100% de doações públicas?
O único país a adotar essa proposta é o Butão.
Quais outras propostas existem?
Também são debatidos no Congresso, por meio de projetos de lei, o financiamento público de campanha aliado ao Fundo Partidário (PL 2222/2007) e o financiamento público com teto de contribuição (PL 1210/2007). A primeira proposta prevê que empresas sejam proibidas de doar a partidos, mas possam contribuir para o Fundo Partidário, ou um fundo específico, coordenado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A segunda proíbe a doação de empresas, mas permite a doação de pessoas físicas a partidos ou políticos até que se atinja um determinado limite. O restante do financiamento seria público.
Acesso em 02/04/2015
Leia a notícia completa em:
Carta Capital
www.cartacapital.com.br