A pouco mais de um ano para as eleições municipais de outubro de 2016, os moradores de 39 cidades mineiras ainda não sabem se terão o mesmo prefeito até 31 de dezembro do ano que vem. Isso porque os eleitos em 2012 são acusados pela Justiça Eleitoral de crimes como abuso de poder econômico ou político e compra de votos, e tiveram os mandatos cassados. Dentro desse grupo, 13 apresentaram recursos para ficar nos cargos ou voltar para eles. Os outros 26 conseguiram recuperar o direito de permanecer no comando de suas cidades – mas as decisões podem ser alteradas quando recursos do Ministério Público forem julgados. Em Minas, há ainda o caso de outros 55 prefeitos que responderam a processos depois das eleições, todos já encerrados. Treze deles perderam o mandato definitivamente e 42 conseguiram reverter a sentença negativa.
A indefinição sobre a situação dos 39 prefeitos pode ser atribuída à morosidade e falta de estrutura do Judiciário, mas também à legislação brasileira, que permite uma infinidade de recursos – usados em larga escala pelos advogados – para retardar o processo e garantir o mandato político. A Lei da Ficha Limpa até tentou alterar a situação ao trazer um artigo que estabelece a prioridade para o julgamento das ações eleitorais sobre todas as demais, com exceção de mandados de segurança e habeas corpus. No entanto, cinco anos depois de entrar em vigor, a regra ainda não saiu do papel. Nos próximos dias, o Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE) vai encaminhar um ofício ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) solicitando que o órgão oriente os tribunais sobre a legislação e cobre o desfecho das ações eleitorais.
“Hoje não há prioridade no julgamento desses processos. Quando terminam as eleições, ocorre um acúmulo de processos. E não estou dizendo que seja um problema individual, é institucional”, afirma o juiz e coordenador do MCCE, Márlon Reis. Ele lembra que o grande imbróglio é que tanto os juízes quanto os promotores eleitorais são “emprestados” pela Justiça comum e pelo Ministério Público. Ou seja, os profissionais acumulam a função durante o período eleitoral, e, terminada a disputa, ainda se veem em meio aos processos das áreas em que atuam regularmente. Além disso, o magistrado bate em uma tecla já muito conhecida: as artimanhas jurídicas para prolongar o processo ao máximo, enquanto o político se mantém no poder.
“A nossa legislação ainda permite muitos recursos, e os candidatos vão conseguindo arrastar o processo. Vários prefeitos já têm a cassação decretada, mas se mantêm nos cargos por causa de recursos. O ideal é a nossa legislação diminuir um pouco para o processo ficar mais ágil”, opina o promotor e coordenador das promotorias eleitorais de Minas Gerais, Edson Resende. De acordo com ele, na medida do possível o Ministério Público até tenta agilizar a tramitação dos processos com os juízes. Mas nem sempre dá certo. “Essa questão frustra promotores, juízes e cidadãos que precisam de uma resposta mais rápida”, lamenta.
Extinção
As regras para a substituição de políticos cassados variam de acordo com o número de votos obtidos e o período em que se deu a perda do mandato. Caso o eleito tenha obtido mais de 50% dos votos válidos na eleição, é necessária a realização de novo pleito. Se o percentual de votos foi inferior a 50% e tiverem sido cassados o prefeito e o vice, o cargo é ocupado pelo segundo colocado. Ocorrendo a vacância nos últimos dois anos do mandato, pelo artigo 81 da Constituição Federal, é feita eleição indireta, ou seja, a Câmara Municipal escolhe o novo prefeito. A prática tem mostrado que, caso a perda do mandato se dê a poucos meses do seu fim – geralmente até 180 dias –, o presidente da Câmara assume o cargo.
Recursos garantiram mandatos
Em Pintópolis e São João Batista do Glória, duas pequenas cidades de menos de 10 mil habitantes no interior de Minas Gerais, os prefeitos eleitos em 2008 foram alvos de processos por irregularidades cometidas nas eleições, mas conseguiram terminar o mandato. Graças à lentidão da Justiça e aos infindáveis recursos previstos na legislação brasileira, o processo movido contra eles não foi julgado em definitivo antes de completar os quatro anos de governo.
O caso mais antigo envolve Domingos Martins da Rocha (PT) e Dione Maria Nascimento Silva (PTB). Acusados de abuso de poder econômico e político em razão de uma festa com distribuição de bebidas e comidas e utilização indevida de veículos do transporte escolar em Pintópolis, eles tiveram os mandatos cassados por cinco votos a um pelos juízes TRE em 19 de maio de 2009. Os políticos recorreram da decisão e dois meses depois o processo foi parar no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Nas eleições de 2012, Domingos chegou a cogitar até a hipótese de se candidatar à reeleição, mas diante do risco de ser barrado pela Lei da Ficha Limpa, desistiu da empreitada.
Em São João Batista do Glória, no Sudoeste de Minas, a história não foi diferente. João Heitor de Oliveira (DEM) e Celso Henrique Ferreira (PSDB) foram cassados pelo TSE em maio de 2010 por abuso de poder econômico e compra de votos ao distribuir materiais de construção à população. O juiz relator do caso na ocasião, Benjamin Rabello, alegou que “quanto ao abuso de poder econômico, entendo que os fatos devem ter um enorme alcance, a ponto de desequilibrar o pleito, ou seja, afetar a normalidade e legitimidade das eleições”, ressaltou no voto, que foi seguido pelos colegas. O recurso contra a decisão, apresentado por eles, foi para o TSE em julho de 2010. Nas eleições de 2012, João Heitor chegou a cogitar a disputa pela reeleição, mas desistiu por problemas de saúde.
Pessoas carentes
Por pouco Luiz Carlos Maciel e Deoclécio Consentino, ambos do DEM, conseguiriam terminar o mandato conquistado nas urnas de Ouro Fino em 2008. Acusados pelo Ministério Público de distribuir benesses a pessoas carentes em troca de votos, responderam a processo por abuso de poder econômico, de autoridade e político. Em dezembro de 2009, eles tiveram a cassação confirmada pelo TRE mineiro. Em 2010, a ação foi parar no TSE.
Eles foram afastados do cargo pela Justiça Eleitoral em abril de 2012, mas voltaram aos cargos com liminar. No entanto, em setembro – três meses antes do fim do mandato – deixaram definitivamente seus cargos por uma decisão da Câmara Municipal, que cassou o mandato deles em um processo de impeachment. Na ocasião, o então presidente da Câmara, Lauro Tandeli, assumiu a cadeira interinamente. Suspeito de envolvimento no esquema de fraudes em licitações e desvios de verbas públicas, ele também foi afastado do comando da cidade e colocado em seu lugar o vice-presidente da Câmara, Aparecido Nogueira de Sá.
Acesso em: 23/06/2015
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Estado de Minas
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