O modelo eleitoral desenhado pela Constituição de 1988 permite candidaturas avulsas. É o que afirma o professor Gilberto Bercovici, em parecer encaminhado ao Tribunal Superior Eleitoral junto com pedido de registro de candidatura do empresário Cláudio Nasser. Ele pediu para ser candidato a presidente mesmo sem estar filiado a nenhum partido, contrariando a regra do inciso V do parágrafo 3º do artigo 14 da Constituição.
De acordo com o parecer de Bercovici, a candidatura avulsa se tornaria possível a partir da contradição existente entre a exigência de filiação partidária para a elegibilidade na Constituição e tratados internacionais de direitos humanos, como o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos e a Convenção Americana de Direitos Humanos.
“Esses tratados são acatados como normas constitucionais pela própria Constituição Federal e garantem liberdade de participação nos assuntos públicos”, afirma o texto. De acordo com a Emenda Constitucional 45/2004, os tratados internacionais assinados pelo Brasil e aprovados pelo Congresso têm status de emenda constitucional. E em 2008, o Supremo Tribunal Federal decidiu, no Recurso Extraordinário 446.343, que os tratados têm natureza supralegal, mas infraconstitucional.
Para Bercovici, no entanto, a vinculação entre a representação política e o partido político não é absoluta. “Podemos indicar várias experiencias internacionais que admitem postulação de candidaturas e exercícios de mandatos por indivíduos em filiação partidária como Estados Unidos, Rússia, Portugal, Holanda, Austrália”, expõe.
Segundo o jurista, as candidaturas avulsas são mais bem-sucedidas. “Um aspecto interessante nas experiencias internacionais é que há diferentes graus de independencia, ou seja, os políticos podem se aproximar mais ou menos dos partidos políticos, ainda que, sob o enfoque jurídico, sejam definidos estritamente como candidatos sem filiação partidária”, afirma.
O Brasil faz parte do grupo de 21 países em que a candidatura avulsa não e permitida. O artigo 14 da Constituição Federal de 88 afirma que é uma condição de elegibidade estar filiado ao partido político. Portanto, os partidos políticos tem uma espécie de monopólio do registro de candidatura.
Perigo para eleições
Em junho deste ano, o ministro Luís Roberto Barroso afirmou, em decisão monocrática, que há importante periculum in mora inverso no caso. Ou seja, autorizar monocraticamente que haja uma candidatura sem filiação partidária, sem a devida reflexão, causaria insegurança jurídica às eleições deste ano.
“Não é possível instalar a candidatura avulsa de forma imediata justamente porque o sistema eletrônico está baseado na ideia de eleições ligadas a partidos, de forma que o sistema precisaria ser adaptado para implementar a mudança. Eventuais ajustes, em tempo tão exíguo, poderiam comprometer a segurança das eleições de 2018", decidiu Barroso. Já em julho, a Procuradoria-Geral da República informou não ter interesse em recorrer.
Em 2017, a PGR, em parecer encaminhado ao STF, afirmou que, como o Brasil é signatário do Pacto de São José da Costa Rica, que não prevê a filiação partidária como requisito para ser votado, a Justiça Eleitoral deve permitir as candidaturas independentes nas próximas eleições. O processo está sob relatoria do ministro Luís Roberto Barroso.
Em outubro de 2017, o Plenário do STF reconheceu a aplicação de repercussão geral na discussão sobre a possibilidade de candidatos sem filiação partidária participarem de eleições. Os ministros entenderam que ficou prejudicado o recurso extraordinário com agravo do advogado Rodrigo Mezzomo, que tentou disputar a eleição para prefeito do Rio de Janeiro no ano passado e perdeu em todas instâncias da Justiça Eleitoral antes de recorrer ao STF, pois o pleito já aconteceu. Apesar disso, não ficou inviabilizado o julgamento do mérito da causa, decidiu o Supremo.
ARE 1.054.490
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