Condenação por improbidade administrativa só é hipótese de inelegibilidade se ficar claro que o gestor público enriqueceu ilicitamente. Mas esse fato deve ser demonstrado, não presumido. Com esse entendimento, o ministro do Tribunal Superior Eleitoral Luiz Edson Fachin aceitou recurso e validou o registro da candidatura de Rubens Bomtempo (PSB) a deputado estadual do Rio de Janeiro nas eleições de outubro.
Ex-prefeito de Petrópolis, Bomtempo teve seu pedido de registro de candidatura negado pelo Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro. A corte declarou-o inelegível com base no artigo 1º, I, “l”, da Lei Complementar 64/1990. O dispositivo diz que não podem assumir cargos públicos “os que forem condenados à suspensão dos direitos políticos, em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão judicial colegiado, por ato doloso de improbidade administrativa que importe lesão ao patrimônio público e enriquecimento ilícito, desde a condenação ou o trânsito em julgado até o transcurso do prazo de oito anos após o cumprimento da pena”.
O TRE-RJ baseou sua decisão na condenação de Bomtempo pela prática de ato doloso de improbidade administrativa que ocasionou dano ao erário. Isso porque ele, quando prefeito de Petrópolis, dispensou licitação para contratar diretamente a Fundação Dom Manoel Pedro da Cunha Cintra com o objetivo de executar obras da Secretaria Municipal de Habitação e fornecer mão de obra para apoio operacional. Nesse caso, o político recebeu as penas de ressarcimento ao erário no valor de R$ 209.860,44 e suspensão dos direitos políticos pelo prazo de cinco anos.
Representado pelo advogado Rafael Carneiro, Bomtempo recorreu da decisão do TRE-RJ. Argumentou que a condenação por lesão ao erário se deu por dano in re ipsa — independentemente da comprovação de que os cofres públicos tenham sido efetivamente desfalcados — e que dessa presunção não decorre automaticamente a configuração do enriquecimento ilícito, já que não houve no acórdão qualquer indicação de que os envolvidos tenham recebido valores indevidos.
Fachin concordou com o ex-prefeito de Petrópolis. Segundo o ministro, “o TRE-RJ presumiu a existência do enriquecimento ilícito, quando a própria Justiça competente não o fez”. Para ele, não há elementos na ação de improbidade administrativa que demonstrem que Bomtempo obteve vantagem financeira ou não prestação do serviço contratado.
“Reforce-se, no ponto, que o acórdão do Tribunal de Justiça fluminense é silente quanto à eventual superfaturamento ou pagamento desproporcional à Fundação Dom Manoel Pedro da Cunha Cintra que pudesse indicar a ocorrência de enriquecimento ilícito de terceiros. Ao contrário, extrai-se da decisão apenas que houve a contraprestação pecuniária por serviços prestados, o que não indica, por si só, o indevido acréscimo patrimonial.”
Para fortalecer sua interpretação, o ministro citou precedentes do TSE. A corte eleitoral já concluiu que, para se caracterizar enriquecimento ilícito, é preciso que a decisão da Justiça comum faça referência ao recebimento de valores sem justa causa ou ao pagamento de valores indevidos (REsp 10.788). Além disso, o TSE tem o entendimento de que a dispensa indevida de licitação não acarreta, por si só, o enriquecimento ilícito para gerar inelegibilidade. O tribunal também avalia que não é possível usar presunções ou termos genéricos para impedir uma candidatura.
Dessa maneira, Fachin aceitou o recurso de Bomtempo, afastou a incidência da causa de inelegibilidade do artigo 1º, I, “l”, da Lei Complementar 64/1990 e validou o registro de candidatura dele a deputado estadual do Rio.
Com isso, os 23.670 votos que Bomtempo recebeu passam a ser considerados válidos, aumentando o coeficiente eleitoral do PSB. Assim, Renan Ferreirinha Carneiro, que obteve a segunda maior votação na legenda — apenas atrás de Carlos Minc, que foi eleito —, deve assumir uma cadeira na Alerj.
Precedente importante
Advogado de Bomtempo, Rafael Carneiro afirmou à ConJur que a decisão do ministro Fachin estabelece um parâmetro relevante para as próximas disputas eleitorais.
“É um precedente importante, pois fixa a tese de que condenação por improbidade administrativa por dano presumido (dano in re ipsa) não preenche os requisitos da hipótese de inelegibilidade.”
Recurso Ordinário 11.550
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