Fonte: Correio Braziliense
O Pros está na mira da Justiça Eleitoral e da Polícia Federal por suspeitas de superfaturamento nas prestações de contas de diversos concorrentes a deputado distrital nas eleições de 2018. Nesta quinta-feira (15/8), agentes da PF estiveram na sede nacional do partido, no Lago Sul, e na gráfica da legenda, em Planaltina de Goiás, em busca de documentos, computadores, celulares e materiais que possam comprovar as supostas irregularidades. A diligência foi determinada pelo desembargador do Tribunal Regional Eleitoral (TRE) Telson Ferreira após pedido do Ministério Público Eleitoral (MPE). O processo corre em sigilo, mas a operação foi deflagrada após denúncia do Correio Braziliense, em fevereiro.
A decisão que autorizou as buscas nos endereços do partido, obtida pela reportagem, foi embasada também pelo depoimento prestado, na terça-feira, pelo secretário nacional da sigla, Edmilson Boa-Morte. À Justiça, ele confirmou o superfaturamento nas contas de candidatos do DF e de outras unidades da Federação. Além disso, detalhou o modus operandi do presidente da legenda, Eurípedes Júnior, e da tesoureira do partido Cintia Lourenço da Silva.
O documento a que o Correio teve acesso revela também que o Ministério Público Eleitoral solicitou o encaminhamento da cópia dos autos com depoimentos e documentos anexados ao processo à Polícia Federal. O MP pretende, com isso, requisitar a abertura de um inquérito policial para apuração dos fatos sob a ótica criminal. Nesse caso, os alvos principais seriam Eurípedes Júnior e Cintia Lourenço. A solicitação não foi analisada pelo desembargador, que, pela urgência, analisou inicialmente apenas o pedido de busca e apreensão.
Comprovantes
Em fevereiro, o Correio revelou que o Pros declarou à Justiça Eleitoral gastos de R$ 5,7 milhões com material gráfico da campanha de 33 concorrentes à Câmara Legislativa. Entretanto, os candidatos que, no total, somaram apenas 11,9 mil votos no pleito de 2018 garantem que caciques da legenda inflaram os números e negam o recebimento das vultosas quantidades de santinhos e adesivos.
A fartura dos itens, declarados pelo partido e custeados por recursos públicos dos Fundos Partidário e de Financiamento Especial de Campanha, é tamanha que seria possível, por exemplo, estampar três vezes todos os 1,7 milhão de automóveis da capital com os 6 milhões de adesivos que a legenda informou ter confeccionado.
Para concretizar o repasse médio de R$ 172 mil em propaganda impressa a cada candidato, o partido teria utilizado uma brecha na legislação eleitoral que dispensa a apresentação de comprovantes e recibos na transferência de valores em material de campanha. Essas transações são apresentadas como “receitas estimáveis em dinheiro”.
A gráfica responsável pela impressão do material é do próprio partido — o que se comprova pelo CNPJ estampado em alguns dos santinhos — e fica em Planaltina de Goiás (GO). Conforme os relatos de candidatos, Eurípedes Júnior teria ciência das supostas irregularidades e se beneficiaria delas.
Coação
O mandado de busca e apreensão baseia-se no processo de prestação de contas de Marizete Pereira. Segundo o documento produzido pelo Pros, ela recebeu R$ 159 mil em material para a campanha de 2018. Teve 490 votos. Em depoimento ao TRE, Marizete admitiu que sofreu pressão para assinar a declaração às pressas e não teve tempo sequer de conferir os valores apresentados pela legenda.
“Eu me dei conta do valor de mais de R$ 100 mil quando o meu celular começou a tocar (após reportagem do Correio Braziliense). Só soube depois que saiu na imprensa”, afirmou. “Fiquei sabendo, quase nos últimos minutos, que tinha que fechar as contas. Se eu não fechasse, seria prejudicada. Eu que mantenho minha família e criei os meus dois filhos. Fiquei com medo de ser prejudicada no TRE”, declarou ao Tribunal e ao Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT).
A ex-candidata a distrital negou ter recebido a quantia de material gráfico descrita pelo partido. “Recebi zero, zero, zero, como está nos autos. (Não recebi) Nem em espécie. Foi colocada nos autos a minha conta bancária. O material chegou quatro dias antes. Foi uma terça-feira. E a eleição era no domingo”, contou.
Em nota, o Pros alega que o material impresso para os candidatos da legenda foi produzido em gráfica do partido, o que tornaria impossível a hipótese de superfaturamento. “Ao ser doado ao candidato, é necessário haver uma estimativa do valor, que é diferente do custo real de produção. Portanto, se o valor informado é mais elevado ou mais baixo, isso não significa vantagem financeira para o partido, já que não houve mescla de dinheiro.”
A legenda destaca que a ação da Polícia Federal não é de natureza criminal. “Trata-se de uma diligência determinada em um processo de prestação de contas, de natureza cível”, informa o texto. “Dessa forma, o partido reitera que desconhece qualquer atitude de malversação de recursos na campanha eleitoral e continuará aguardando a apuração dos órgãos competentes”, complementa.
Irregularidades muito similares às que teriam sido praticadas no DF causaram a reprovação das contas de Dona Cida, candidata a deputada federal por Goiás pelo Pros. Mãe de Eurípedes Júnior, presidente nacional da legenda, ela recebeu R$ 1,7 milhão do partido. Chamou a atenção da Justiça, além de uma série de outros problemas, que parte considerável desses gastos não pudesse ser comprovada com a análise da contabilidade da campanha. O caso está em fase de recursos.
Memória
Denúncia em fevereiro
Em 28 de fevereiro, três dias após a publicação das denúncias no Correio, o Ministério Público emitiu parecer questionando os métodos do partido e pedindo apuração rápida do caso à Justiça Eleitoral. O MP fez o posicionamento no processo de prestação de contas de Gilberto Camargos, um dos candidatos ouvidos pela reportagem. Ele recusou-se a assinar a prestação de contas produzida pelo Pros. Às pressas, elaborou uma declaração em que justifica o atraso e detalha a suposta tentativa de fraude cometida pelo partido. Com base na reportagem do jornal e na justificativa de Camargos, o MP, em petição assinada pelo procurador eleitoral José Jairo Gomes, requereu, à época, ao Tribunal Regional Eleitoral a oitiva do candidato para esclarecimentos. No mesmo período, o órgão solicitou audiência com Marizete Pereira, cujo processo é base para a operação da Polícia Federal.