Fonte: Globo
Boné é adereço ou faz parte de identidade cultural de uma pessoa? Para o ministro Sérgio Banhos, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), vale a segunda opção. Em decisão desta terça-feira, ele autorizou que o candidato a deputado federal Douglas Belchior (PTSP) utilize o item em sua foto de urna, sob o argumento de que o acessório faz parte de uma característica sociocultural do postulante à Câmara dos Deputados.
O caso chegou ao TSE por meio de um recurso apresentado pela defesa do candidato, que é militante do movimento negro e que este ano decidiu concorrer a uma vaga como parlamentar. Quando apresentou o seu registro de candidatura, Belchior juntou ao processo uma foto em que aparece ostentando um boné de aba reta. Mas o Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo barrou o uso do chapéu, por entender que se tratava de um mero "elemento cênico".
Ao analisar o caso, o ministro do TSE apontou que em que pese a avaliação feita pelo tribunal regional entre "adorno e indumentária", o uso do boné pelo candidato, "neste caso específico, não atrapalha a visualização do seu rosto nem dificulta o seu reconhecimento pelo eleitor", o que atende aos requisitos previstos nas regras das fotografias dos candidatos prevista pela Justiça Eleitoral.
De acordo com as regras para as fotografias oficiais dos candidatos, as imagens têm que mostrar os candidatos "com trajes adequados". Mas a norma garante a utilização de "indumentária e pintura corporal étnicas ou religiosas, bem como de acessórios
necessários à pessoa com deficiência".
A proibição fica por conta de "elementos cênicos e de outros adornos, especialmente os que tenham conotação de propaganda eleitoral ou que induzam ou dificultem o reconhecimento do candidato pelo eleitorado".
A defesa de Belchior argumentou ao TSE justamente que o boné usado pelo candidato faz parte da maneira como ele é reconhecido pelo seu eleitorado. E que a proibição dificulta sua identificação perante o eleitorado, restringindo o direito à utilização de
indumentária que identifica a cultura que o candidato representa.
Para Banhos, porém, é relevante "a assertiva de que a utilização do acessório pelo candidato, que tem origem afrodescendente e é engajado na cultura rapper, está diretamente ligada à sua própria imagem perante o eleitorado, o que, em princípio, pode ser considerado elemento étnico e cultural, que se enquadra no permissivo legal".
Advogado do candidato, Fernando Neisser explica que a decisão do ministro do TSE estende a leitura de maior tolerância com questões religiosas e étnicas para a cultura periférica.
“O TSE mostrou extrema sensibilidade à questão identitária envolvida nesse caso. Não se trata de bater o pé para estar na urna com boné, mas de reconhecer que há uma cultura própria de um grupo social periférico, que busca afirmação e reconhecimento”,
disse ao GLOBO.
A decisão do ministro, porém, é provisória, e vale apenas para o caso específico de Belchior. O mérito do caso ainda deverá ser analisado.
Nestas eleições, a questão de adereços nas fotos exibidas nas urnas também esteve no centro de uma discussão envolvendo o uso de turbantes. A candidata a deputada estadual no Pará Lívia Noronha (PSOL) foi intimada pelo tribunal regional do estado a mudar a imagem exibida na urna eletrônica por "desconformidade com o parâmetro de enquadramento estabelecido".
Após o caso repercutir nas redes sociais e nos movimentos de mulheres negras, o TRE do Pará voltou atrás e permitiu que a candidata pudesse manter a foto original, portando o turbante.