Fonte: Conjur
Como um dos dispositivos legais que embasaram a pretensão inicial deixou de existir, e não houve demonstração de prejuízo ao erário ou enriquecimento ilícito, a 1ª Vara Federal de Ourinhos (SP) absolveu uma ex-prefeita de Campos Novos Paulista (SP) e um empresário em uma ação de improbidade administrativa.
O Ministério Público Federal alegou que, em 2009, a ex-prefeita contratou shows de forma irregular, sem licitação, por intermédio de uma empresa que só tinha autorização para comercialização das apresentações dos artistas nas datas correspondentes ao evento promovido pela prefeitura.
De acordo com o MPF, houve violação ao inciso III do artigo 25 da Lei de Licitações, que exige contratação direta ou por meio de empresário exclusivo. O órgão também apontou prejuízos ao Ministério do Turismo, devido à contratação por um valor maior do que se tivesse ocorrido diretamente com os artistas ou seus representantes.
Assim, as acusações eram de atos de improbidade que causam enriquecimento ilícito, conforme o artigo 9º da Lei de Improbidade Administrativa (LIA); que causam prejuízo ao erário, conforme o artigo 10; e que atentam contra os princípios da administração pública, conforme o artigo 11.
Velha e nova LIA
A LIA, de 1992, foi alterada por uma lei de 2021, conhecida como nova LIA. Recentemente, o Supremo Tribunal Federal decidiu que a nova LIA só retroage com relação a atos culposos sem condenação transitada em julgada.
Para a configuração da improbidade administrativa, a nova LIA passou a exigir o dolo — ou seja, a vontade livre e consciente de causar o dano. Com relação ao artigo 10, o novo regramento passou a exigir a perda patrimonial efetiva. E a norma também revogou alguns incisos do artigo 11 que previam certos atos atentatórios aos princípios da administração pública.
No caso concreto, a acusação de violação ao artigo 11 era baseada no inciso I: "Praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto, na regra de competência". Tal dispositivo foi revogado pela nova LIA.
Assim, a juíza Giovana Aparecida Lima Maia constatou que "a conduta inicialmente tipificada passou a ser indiferente para fins sancionatórios".
Dolo
A magistrada também notou que a prefeitura aceitou firmar o contrato embora o empresário não tivesse exclusividade sobre os artistas e não os representasse habitualmente. De acordo com ela, a representação eventual e esporádica, para dias e locais determinados, "abre lugar, nas contratações do poder público, para o indesejável risco das intermediações, comissões e especulações".
Na interpretação da juíza, a ex-prefeita agiu com dolo, pois estava ciente dos termos da contratação, mas resolveu ignorar a regra da Lei de Licitações. Ela ressaltou que todos os documentos do procedimento — incluindo um parecer do assessor jurídico — foram feitos e assinados no mesmo dia. Além disso, foram fundamentados em um convênio que ainda não havia sido firmado com o Ministério do Turismo.
Sem prejuízos
Por outro lado, Giovana não viu conluio entre a ex-prefeita e o empresário para lesar os cofres públicos. Segundo ela, não há provas de que a empresa ou mesmo os artistas tenham enriquecido ilicitamente, já que o serviço foi efetivamente prestado.
Para a juíza, nem mesmo a conduta da então prefeita causou prejuízo ao erário, pois não há provas de que o serviço foi contratado por quantia superior ao praticado no mercado à época, nem de que os valores pagos seriam inferiores caso tivesse ocorrido a devida licitação.
A magistrada ressaltou que não foram contratados apenas os artistas, mas também vários outros serviços, como divulgação do evento, sistema de iluminação, som, palco etc.
Sem enriquecimento ilícito ou prejuízo efetivo ao erário, Giovana entendeu que não foi configurada a prática das condutas tipificadas nos artigos 9º e 10 da LIA.
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Processo 5000066-32.2017.4.03.6125