Fonte: Conjur
O Tribunal Superior Eleitoral começou a julgar nesta quinta-feira (22/6) uma das ações de investigação judicial eleitoral (Aije) que acusam Jair Bolsonaro (PL) de abuso de poder político nas eleições de 2022. Se condenado, o ex-presidente pode ficar inelegível. Walter Braga Netto, candidato a vice de Bolsonaro em 2022, também é alvo da ação.
O pedido ajuizado pelo PDT acusa Bolsonaro de usar indevidamente os meios de comunicação na reunião com embaixadores em que o então presidente atacou o sistema eleitoral.
No encontro com os representantes diplomáticos, em 18 de julho de 2022, no Palácio da Alvorada, Bolsonaro sugeriu que as eleições de 2018 foram fraudadas para impedir sua vitória no primeiro turno. Afirmou ainda que a urna eletrônica não é segura e que hackers invadiram os sistemas do TSE para apagar votos.
Na sessão desta quinta, o relator do caso, ministro Benedito Gonçalves, leu seu relatório de 43 páginas (leia a íntegra no final desta reportagem). Em seguida, os advogados do PDT e de Bolsonaro fizeram suas sustentações orais e a Procuradoria-Geral Eleitoral se manifestou pela declaração de inelegibilidade do ex-presidente. A análise será retomada em 27 de junho.
"Houve uma reunião com grave desvio de finalidade para desmoralizar as instituições, usou-se bem público para disseminar fake news. Houve ataques sistêmicos. Houve acusações e impropérios sem lastro nenhum e tentativas de transformar a nossa nação em pária internacional", disse o advogado.
Já o advogado Tarcísio Vieira de Carvalho, responsável pela defesa de Bolsonaro, afirmou que a reunião com embaixadores foi feita em julho, "muito antes" do período eleitoral. Para o advogado, isso impede a condenação de Bolsonaro por suposto uso do aparato estatal para benefício eleitoral.
"Se o presidente queimou a largada em matéria de propaganda, que se aplique a multa do artigo 176 da Lei das Eleições. Mas o PDT, em uma espécie de esquenta eleitoral, ajuizou uma Aije", disse, complementando que o procedimento correto deveria ter sido uma representação eleitoral.
Por fim, o vice-procurador-geral eleitoral, Paulo Gustavo Gonet Branco, defendeu a inelegibilidade de Bolsonaro, mas não a de Braga Netto — devido à individualização da conduta. Segundo Gonet, houve desvio de finalidade porque o ex-presidente usou de TV pública com "fins eleitoreiros".
"O discurso se dirigiu ao conjunto dos eleitores brasileiros e não apenas a representantes diplomáticos que não possuem capacidade eleitoral ativa. O presidente pode reunir o corpo diplomático em Brasília para relatar fatos de repercussão e há margem de discricionariedade política ampla para o presidente decidir o que é assunto relevante e inquietante para ensejar preocupação das potências estrangeiras."
Alegações finais e trâmite
O trâmite da ação respeitou a metodologia definida pelo relator, que consistiu em apreciar de pronto preliminares e questões prejudiciais cujo acolhimento extinguiriam a ação, total ou parcialmente. A instrução está completa e as alegações finais das partes, devidamente registradas.
O TSE atestou a própria competência para julgar o caso e fixou importante precedente sobre a possibilidade de incluir novos documentos em Aijes já em tramitação — o caso tratou da "minuta do golpe" encontrada em janeiro na casa do ex-ministro da Justiça, Anderson Torres.
O alargamento das investigações gerou reclamações pela defesa de Jair Bolsonaro, feita pelo advogado Tarcísio Vieira de Carvalho, as quais foram rejeitadas pelo relator, como mostrou a revista eletrônica Consultor Jurídico. Houve ainda uma petição feita por um advogado usando o modelo de inteligência artificial ChatGPT.
Nas alegações finais, a defesa repetiu questões processuais já definidas e, no mérito, em suma, defendeu que Bolsonaro abordou de forma legítima o debate sobre a confiabilidade do sistema eleitoral e que suas manifestações respeitaram os limites da liberdade de convicção pessoal.
A defesa acrescentou ainda que o vídeo da reunião com os embaixadores foi retirado do ar por decisão liminar e não foi usado na campanha eleitoral. Para o ex-presidente, não houve qualquer hostilidade antidemocrática ao sistema eleitoral no evento.
Já os advogados do PDT, Walber Agra e Ezikelly Barros, destacaram que o discurso na reunião, a postura antidemocrática de Bolsonaro, incluindo os graves fatos de 8 de janeiro de 2023 e a ação pela qual o PL, partido do candidato, contestou o resultado das eleições.
A Procuradoria-Geral Eleitoral, por sua vez, opinou pela parcial procedência da ação para declarar Jair Bolsonaro inelegível porque as distorções e inverdades praticadas por ele no evento influenciaram parte do eleitorado a desconfiar do sistema, o que se confirmou por fatos notórios, alguns violentos, posteriores à votação.
Segundo a PGE, o que houve no episódio foi o chefe de Estado dizendo, nessa qualidade, para brasileiros e autoridades de países com embaixadores no país, que não se podia acreditar na legitimidade do processo eleitoral.
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Aije 0600814-85.2022.6.00.0000