O desafio do poder público, dos partidos políticos e dos organismos internacionais para garantir a efetiva participação feminina na política nos países de todo o mundo, especialmente na Ibero-América, foi o principal ponto discutido na primeira mesa de debates do VII Encontro Ibero-Americano de Magistradas Eleitorais. O evento, que reúne magistradas de diferentes nacionalidades, começou nesta quinta-feira (17) e se estende até esta sexta (18), no edifício-sede do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em Brasília.
Presidida pela ministra Luciana Lóssio, a primeira mesa abordou a temática “A Atuação dos Organismos Internacionais na Defesa da Participação da Mulher na Política”. Primeira a discursar, a coordenadora da Área de Gênero para América Latina do Instituto Internacional para Democracia e Assistência Eleitoral (IDEA Internacional), Pilar Tello, fez um balanço das medidas e dos avanços obtidos na região no que se refere à presença feminina na política.
De acordo com ela, o primeiro passo dado pelos países latino-americanos nesse sentido foi o reconhecimento do direito ao voto da mulher, sendo o Brasil o segundo país a incluir a garantia em sua legislação. Em seguida, começaram as discussões sobre cotas de gênero e mecanismos de ações afirmativas em prol do aumento da participação feminina na política. Hoje, cinco países da América Latina já aprovaram a alternância em cargos públicos e de liderança (50% para cada gênero) e 11 têm cotas.
Embora a legislação brasileira estabeleça o preenchimento de no mínimo 30% e no máximo 70% para candidaturas de cada sexo nas eleições proporcionais, em um ranking de 19 países, o Brasil ocupa o último lugar na representação feminina na Câmara dos Deputados. “Infelizmente, os números mostram que ainda há grande desigualdade na nossa região. Temos uma cultura extremamente patriarcal e machista. Estamos progredindo, mas esta é uma agenda ainda a ser revisada. Ainda temos muito a avançar”, concluiu a representante do IDEA.
Sofia Vincenzi, oficial de Programas do Centro de Assessoria e Promoção Eleitoral do Instituto Interamericano de Direitos Humanos (Capel/IIDH), apresentou as conclusões de um estudo realizado pelo órgão acerca da realidade da representação da mulher na política em três países (Costa Rica, El Salvador e Panamá). Segundo ela, a partir dessa pesquisa, a entidade decidiu focar seus esforços na equidade de gênero, destacando a necessidade de considerar a participação da mulher na política como um direito a ser cumprido efetivamente.
“Não devemos ficar só na letra da lei, pois há avanços, mas há também retrocessos. Muitas vezes os objetivos não são alcançados. Há o desrespeito porque não há consciência sobre a importância da participação política das mulheres. Os órgãos eleitorais e partidários devem investir em educação e na promoção dos valores democráticos”, completou Sofia.
ONU Mulheres
“O mundo que as mulheres sonharam, reivindicaram, politizaram e negociaram há 20 anos durante a Conferência [4ª Conferência Mundial sobre as Mulheres, em 2995] ainda não foi possível de ser construído na sua plenitude”. Essa foi uma das conclusões das comemorações estimuladas pela campanha global da ONU Mulheres “Pequim +20: Empoderar as Mulheres”, realizada em 2015, e que foi apresentada na tarde de hoje às magistradas eleitorais pela gerente de Programas da ONU Mulheres no Brasil, Joana Chagas.
Em sua palestra, ela destacou que a organização tem adotado uma série de medidas e desenvolvido campanhas e ações com o objetivo de combater todas as formas de discriminação contra a mulher, exigir o compromisso dos poderes públicos e dos partidos políticos com a igualdade de gênero de fato, fortalecer as lideranças das mulheres e combater o assédio e a violência política.
Joana Chagas também apresentou estatísticas mundiais acerca da presença feminina na política. “Em 2014, ainda eram nove mulheres chefes de Estado e 15 mulheres chefes de Governo em todo o mundo. Naquele mesmo ano, 21,8% dos parlamentares eram mulheres e somente 17% dos ministros de governo eram do sexo feminino, a grande maioria atuando em setores sociais, educacionais e familiares. Conforme a União Interparlamentar, em 2013, o Brasil ocupava a 156ª posição no ranking de mulheres no parlamento, com 8,6%”, destacou.
Ainda segundo Joana, a principal estratégia da ONU Mulheres na América Latina, em parceria com o Parlamento Latino-Americano (Parlatino), é tentar promover uma norma-marco que reconheça a paridade como uma das formas fundamentais de democracia.
Segunda mesa
A segunda mesa do encontro, presidida pelo ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) Admar Gonzaga, tratou sobre "A Evolução das Jurisprudências Nacionais sobre a Igualdade de Gênero dos Processos Eleitorais". Ao iniciar seu discurso o ministro disse que procura conduzir sua postura no TSE sempre focado na igualdade, que, segundo ele, é o pilar da democracia. "Entendo que qualquer espécie de discriminação significa, para mim, uma expressão senão de um déficit intelectual, de um déficit moral", afirmou.
O ministro lembrou que o Brasil passou por um processo tortuoso de evolução das candidaturas femininas. Na visão dele, para que as mulheres participem efetivamente da política é preciso que ocorram algumas modificações na exigência de cotas. "Temos que buscar cotas para os diretórios. Não adianta fazer uma cota de gênero, ao meu ver, pelo menos, sem que essas mulheres tenham participado da vida política do partido, tenham discutido dentro das hostes partidárias os temas da atualidade e os projetos de futuro daquelas ideologias que estão em cada ambiente partidário. A discussão tem que ser feita dentro do partido, para que as mulheres se sentem à mesa com igualdade de condições, com direito a voz e voto, para aí, sim, se candidatarem".
Em sua participação, a magistrada Maria Del Carmem, do Tribunal Eleitoral de Poder Judicial da Federação do México, disse que o país evoluiu na questão jurisprudencial. "Mesmo que as jurisprudências pareçam maravilhosas, e são, por trás delas existe uma luta". Ela explicou que é a única mulher do Tribunal Superior e que sairá do exercício em novembro. Ela disse que o México, a partir de 2014, em uma reforma constitucional, abandonou as cotas a passou a adotar a paridade, ou seja, 50% para cada gênero."Por mais que festejemos a paridade na constituição, pode ser letra morta se não existirem as regras para materializar, se não existir ação para garantir o alcance da igualdade sustentável".
A magistrada citou a recente aprovação de um protocolo para evitar e erradicar a violência política contra as mulheres. No entanto, ela afirmou que ainda faltam jurisprudências para julgar casos de violência de gênero. A juíza disse ainda que as sentenças do Tribunal com o julgamento de perspectivas de gênero, se sustentam nas práticas internacionais e nos tratados que obriga a Corte a tomar decisões que preveem a participação da mulher.
A conselheira do Conselho Nacional Eleitoral da Colômbia, Idayris Perez, reforçou que a igualdade de gêneros não é um assunto somente das mulheres e sim da sociedade. Disse ainda que é preciso que haja o reconhecimento da via dupla da participação feminina na política: de ser eleita e poder eleger.
Já a magistrada suplente do Tribunal Eleitoral do Panamá, Lourdes Gonzáles, propôs que o encontro seja transformado em um organismo eleitoral, a fim de que as representantes participantes do evento sejam convidadas como observadoras dos processos eleitorais nos países da América Latina, para fiscalizar a normatização da questão de gênero nestes processos.
Compartilharam também as experiências dos respectivos países, a juíza do Tribunal Contencioso Eleitoral do Equador, Patrícia Zambrano Villacrés, a vocal do Tribunal Supremo Eleitoral da Bolívio, Maria Eugênia Choque Quispe, e a diretora de Registro Civil da Junta Central Eleitoral da República Dominicana, Dolores Fernández.
Acesso em: 18/03/2016
Leia notícia completa em:
Tribunal Superior Eleitoral
www.tse.jus.br