O juiz da 69ª Zona Eleitoral, Fábio Renato Mazzo Reis, cassou o diploma do vereador Fagner Vinícius Bussi da Silva (PV) por irregularidades na prestação de contas nas eleições municipais de 2016, em Lucélia. A sentença, registrada nesta terça-feira (7) e com publicação prevista para esta quinta-feira (9) no "Diário da Justiça Eletrônico" do Tribunal Regional Eleitoral do Estado de São Paulo (TRE-SP), ainda determina a inelegibilidade do parlamentar pelo prazo de oito anos, a contar da eleição.
A decisão foi motivada por uma representação proposta pelo Ministério Público Eleitoral visando a apurar prática de captação e gasto de recursos ilícitos. Silva concorreu ao pleito de 2016 e foi eleito com 430 votos, o equivalente a 4,19% dos votos válidos, segundo as informações do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
O MPE afirma na denúncia que, ao prestar contas de campanha à Justiça Eleitoral, o vereador omitiu receitas que não tramitaram pela conta-corrente de campanha e ainda informou doação estimável em dinheiro (“cessão de uso de veículo”) assinada por pessoa falecida, segundo a decisão. A Promotoria ainda destaca que as receitas omitidas perfazem 39% do total de receitas e despesas declaradas à Justiça Eleitoral.
Em depoimento ao MPE, o vereador alegou “que fez uma campanha simples e com recursos provenientes de fontes lícitas, tanto que a prestação de contas foi aprovada com ressalvas pelo Juízo Eleitoral”. Ele ainda defendeu a licitude das doações estimadas em dinheiro sem trâmite pela conta-corrente de campanha e justificou o documento assinado em nome de pessoa já morta como sendo um mero erro escritural, segundo consta na sentença.
O parlamentar alegou ainda que a diferença apontada pelo MPE na prestação de contas retificadora, quando comparada à primeira, "foi ocasionada por desinformação e dúvidas, tanto que, assim que foram identificadas as inconsistências, procurou profissionais habilitados para corrigir sua prestação de contas”. Afirmou também que “a referida diferença não foi capaz de desequilibrar o pleito”, de acordo com o documento judicial.
Silva assegurou que “não houve abuso de poder a ensejar a aplicação do artigo 30-A da lei 9.504/97, pois seria desproporcional aplicá-lo ao caso, e pediu a improcedência da ação”.
Análise do caso
Ao analisar o caso, o juiz apontou que o vereador apresentou a prestação das receitas e despesas no valor de R$ 1.612,45. “Tal prestação de contas foi recebida pela Justiça Eleitoral em 01/11/2016, ou seja, quase um mês depois da realização da eleição, que ocorreu em 02/10/2016”. O magistrado também cita que junto à prestação de contas o representado apresentou um “termo de cessão sobre uso de veículos”, referente a um VW Fusca, assinado pelo vereador como cessionário e por um homem como cedente, pessoa morta ao tempo em que assinado o documento, segundo a decisão.
Conforme a sentença, a Justiça Eleitoral apontou indícios de irregularidade nesta prestação de contas, detectando que o doador de campanha está registrado no sistema de controle de óbitos. O banco onde estava cadastrada a conta de campanha apresentou declaração afirmando que o representado não retirou talão de cheques, além de um extrato da conta corrente de campanha zerado, de acordo com as informações da decisão.
A sentença pontua que foi apresentada uma prestação de contas retificadora assinada pelo parlamentar constando receitas e despesas no valor de R$ 2.526,58 e esta prestação retificadora foi recebida pela Justiça Eleitoral em 18/11/2016. O vereador juntou “termo de cessão sobre uso de veículos” referente ao veículo VW Fusca, mas desta vez assinado por ele como cessionário e por outro homem como cedente. Nos documentos apresentados à Justiça, também consta um “termo de cessão sobre uso de veículos” referente a um GM Prisma, assinado pelo representado como cessionário e por sua mãe, como cedente.
“O parecer técnico da Justiça Eleitoral foi pela reprovação das contas e ato subsequente este Juízo aprovou com ressalvas as contas de campanha”, salientou a sentença. “Analisada a prova documental encartada aos autos, reconheço que a aprovação das contas com ressalvas não foi a melhor decisão, uma vez que o parecer técnico pela desaprovação das contas encontra total amparo na Resolução TSE 23.463/2015”, segundo o magistrado.
O juiz ainda pontuou na sentença que o desacerto da decisão de aprovar as contas com ressalvas ficou ainda mais explícito com a colheita do depoimento pessoal do representado e das testemunhas arroladas por ele próprio.
“Apesar de imputar o erro da prestação de contas ao escritório de contabilidade que lhe assistia na ocasião, o representado relatou que assinou a prestação de contas sem ler. Não bastasse isso, o representado confirmou que utilizou o Fusca de seu tio alguns dias para fazer campanha, que era ele mesmo que o dirigia e que quando pegava o carro nele já tinha combustível, que era colocado por seu tio, dono do carro. Quanto ao automóvel GM Prisma, também usado na campanha, disse que é de sua mãe e que era ela que abastecia o carro, que era dirigido por seu irmão nos atos de campanha”, segundo a decisão.
O magistrado ainda afirma que esses fatos foram confirmados por testemunhas, quando ouvidas em juízo.
“Portanto, não há dúvidas de que o representado recebeu doação de combustível sem que os valores utilizados para comprá-lo transitassem pela conta corrente de campanha, como demonstra o extrato de fls. 42. O valor dessa doação, segundo consta da prestação retificadora – uma vez que a prestação original indicou zero –, perfaz o valor de R$ 414,15”. “Não há como saber se de fato foi apenas esse valor gasto com combustível em sua campanha, pois, uma vez que não transitaram pela conta corrente, não é possível ter um controle efetivo das receitas e despesas, que é o objetivo da legislação eleitoral que visa assegurar a lisura do pleito”, declarou Reis.
Doações irregulares
O juiz eleitoral cita na decisão que “os doadores só podem doar bens de seu próprio patrimônio e o combustível doado pertence a terceiros, razão pela qual o dinheiro utilizado para abastecer os carros deveria transitar pela conta de campanha. Ora, se não fosse essa a inteligência dos dispositivos legais citados não haveria razão de existir uma rubrica específica para 'combustíveis e lubrificantes' no extrato de prestação de contas. Portanto, a prestação de contas retificadora não aponta apenas o fato de que valores gastos na campanha eleitoral não transitaram pela conta, demonstra também que é impossível se saber ao certo qual foi de fato o valor arrecadado e gasto pelo candidato na campanha. E, se a falha foi do escritório de contabilidade, como afirmou o representado, cabia a ele, então candidato, ora representado, conferir a documentação antes de assinar. É o que se espera de uma pessoa que já possui o cargo de vereador e acabara de ser reeleito”, pontuou o magistrado.
Segundo o documento judicial, o responsável pelo escritório contábil disse em juízo que o parlamentar assinou a prestação de contas “na correria” e sem ler. “Porém, esta afirmação não faz sentido, pois a prestação de contas foi apresentada quase um mês depois das eleições (do dia 02/10/2016 ao dia 01/11/2016), ou seja, não havia motivo para 'correria', nem muito menos para assinar documentos tão importantes sem ler”, alegou Reis.
A sentença ainda cita que uma testemunha, que também foi eleita para o cargo de vereador, disse em juízo que utilizou o mesmo escritório de contabilidade e não teve nenhum problema com a Justiça Eleitoral por conta de falha do estabelecimento. A testemunha disse em audiência que considera que o escritório lhe prestou um bom serviço e que promoveram algumas reuniões para passar informações aos candidatos.
“Nesse sentido, não há como deixar de reconhecer que houve arrecadação de recursos em desacordo com a Resolução TSE 23.463/2015, recursos esses não contabilizados na campanha eleitoral, o que é suficiente para configurar captação e gasto ilícitos”, pontuou o juiz.
'Falha grosseira'
Reis ainda pontua que “outra falha grosseira” da prestação de contas do representado foi a apresentação de um termo de cessão sobre uso de veículos” referente a um VW Fusca, assinado por pessoa comprovadamente morta ao tempo em que foi assinado o documento. “Tal fato, em tese criminoso, foi apontado pela Justiça Eleitoral, que detectou que doador de campanha estava registrado no sistema de controle de óbitos”.
Esta informação foi confirmada por um tio do parlamentar, segundo a decisão. O parente do vereador disse que cedeu o referido VW Fusca para a campanha de seu sobrinho e que o nome do homem que estava o documento é o ex-dono deste carro. Ele ainda afirmou que entregou o documento errado ao escritório, ainda em nome do falecido. Confirmou também que foi ele quem assinou o nome do ex-proprietário no documento e que quando assinou o homem já estava morto, de acordo com a decisão.
“Induvidoso, portanto, que o representado apresentou documento falso à Justiça Eleitoral. Ainda que tal conduta tenha decorrido de uma mera desatenção, o que admito apenas para argumentar, não se concebe que num momento fundamental para o funcionamento da Democracia seja dada tão pouca importância ao trato dos documentos que visam fornecer meios da Justiça Eleitoral fiscalizar a lisura do pleito. E, nesse ponto, faltou com a verdade o representado ao dizer em seu depoimento pessoal que não estava assistido por advogado durante a campanha. Nas fls. 17 e 20 constam procurações 'ad judicia' em que constitui uma advogada para prestar assistência jurídica e para fins de acompanhamento na prestação de contas da campanha eleitoral. Ou seja, o representado sempre esteve assistido por advogada e mesmo assim cometeu os erros apontados”, segundo a sentença.
“Portanto, ponderando tudo o que foi dito, tais irregularidades – captação e gasto ilícitos e apresentação de documento falso – revelam-se demasiadamente graves, tendo em vista que os referidos valores deixaram de transitar pela conta bancária específica de campanha, o que impede a verificação de eventuais infrações contábeis e caracteriza a existência do chamado 'caixa dois', afirmou Reis.
Ante o exposto, o magistrado julgou procedente o pedido formulado pelo Ministério Público Eleitoral para cassar o diploma de Fagner Vinícius Bussi da Silva, nos termos do artigo 30-A, parágrafo 2º, da lei 9.504/97, e consequentemente declarou sua inelegibilidade pelo prazo de oito anos, a contar da eleição.
Outro lado
O vereador Fagner Vinícius Bussi da Silva informou ao G1 na manhã desta quarta-feira (8) que já foi informado da decisão de primeira instância que cassou seu diploma, mas vai recorrer à segunda instância assim que iniciar o prazo para recurso.
“O juiz havia aprovado minhas contas com ressalvas, o Ministério Público recorreu e aí o juiz acabou voltando atrás na decisão. Vou recorrer à segunda instância”, afirmou Silva.
Sobre a questão do combustível, o parlamentar alegou ao G1 que seu irmão utilizava e bastecia o carro GM Prisma, juntamente com sua mãe, e, por isso, acreditava não haver a necessidade de relatar os valores na conta-corrente da campanha eleitoral.
Já com relação ao VW Fusca em nome de uma pessoa já falecida, Silva afirmou ao G1 que seu tio entregou por engano o documento antigo do veículo no escritório, mas isso já foi esclarecido e regularizado.
Acesso 10/02/2017, ás 16:18.
Em: http://g1.globo.com/