Fonte: Conjur
É constitucional a incidência do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS) sobre o valor das atividades de apostas. O entendimento foi firmado pelo Supremo Tribunal Federal em julgamento virtual que encerrou nesta sexta-feira (29/5).
A maioria dos ministros acompanhou o voto do relator, ministro Gilmar Mendes. Ficou vencido apenas o ministro Marco Aurélio.
O colegiado firmou seguinte tese: "É constitucional a incidência de ISS sobre serviços de distribuição e venda de bilhetes e demais produtos de loteria, bingos, cartões, pules ou cupons de apostas, sorteios e prêmios (item 19 da Lista de Serviços Anexa à Lei Complementar 116/2003)".
Os ministros também concordaram que nestas situações, a base de cálculo do ISS deve ser o valor a ser remunerado pela prestação do serviço, "independentemente da cobrança de ingresso, não podendo corresponder ao valor total da aposta".
O ministro analisou duas questões constitucionais. A primeira consistiu em saber se é constitucional a incidência de ISS sobre exploração da atividade de apostas. Já a segunda tratou de definir se, estando a atividade de exploração do jogo compreendida no conceito de serviço, a base de cálculo do tributo pode incluir o valor integral da aposta ou deve recair apenas sobre o valor dos ingressos ou das entradas.
Para ele, os serviços de distribuição e venda de bilhetes podem ser enquadrados no conceito de atividade humana voltada à economia. Portanto, disse o ministro, há "esforço humano prestado em favor de terceiro".
Já sobre a base de cálculo, Gilmar Mendes apontou uma questão dúbia. Ao mesmo tempo em que é atribuída competência ao municípios para tributar serviços, cabe à União tributar renda. Para o ministro, uma parte do valor da aposta representa renda, de forma que não cabe ao município tributar sobre isso.
"Não pode o município tributar a renda como se serviços fossem, sob pena de violação à distribuição de competências tributárias estabelecida na Constituição Federal", entendeu.
Gilmar Mendes também afirmou ser de suma importância a legislação complementar na matéria, haja vista que a Constituição "não traz todas as soluções, muito menos em matéria tributária".
Não é serviço
Único a divergir, o ministro Marco Aurélio afirmou que a venda de apostas não pode ser considerada um serviço. Para ele, não é possível definir a cobrança do imposto calculado sobre a venda usando como base de cálculo um imposto que já existe, no caso, o Imposto de Renda. Isso, segundo o ministro, afrontaria a competência da União sobre impostos residuais.
O vice-decano sugeriu a seguinte tese: "Surge incompatível com a Constituição Federal a incidência de Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza – ISS calculado sobre vendas de apostas".
Não participou do julgamento o ministro Dias Toffoli.
Histórico do caso
No caso, o imposto foi lançado pela Prefeitura do Rio de Janeiro sobre o valor das apostas recebida pelo Jockey Club Brasileiro em corridas de cavalos.
O recurso foi interposto contra decisão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, que se baseou em jurisprudência do STJ sobre o mesmo caso para concluir que “a exploração do jogo constitui serviço e é tributável na forma da lei municipal, seja quando a venda de apostas se dá pela própria entidade turfística, seja quando é feita por terceiros”.
Para o Jockey Club, a medida tem caráter confiscatório e fere a Constituição, pois a base de cálculo adotada – o movimento de apostas – é própria de Imposto de Renda, de competência da União. Acrescenta que a venda de pules (bilhete de aposta) não tem pode ser considerada prestação de serviço. Assim, o imposto municipal só poderia incidir sobre o ingresso pago pelos espectadores para acesso ao hipódromo.
A prefeitura tem posicionamento contrário e indica que apostas são o ingresso qualificado para o entretenimento. Em manifestação, o procuradoria-geral da República aponta que exploração de jogos em geral é compatível com a expressão serviços, na definição que o legislador pretendeu.
“O gerenciamento das apostas é uma das principais fontes que alimentam a exploração comercial das competições esportivas equestres e possibilita ao expectador participar ativamente dos páreos. Enquadra-se na previsão normativa de preço o próprio valor das apostas, que, ao final, implica no recolhimento de parte do montante para benefício do recorrente”, disse o órgão.
Em casos anteriores apreciados pelo Supremo Tribunal Federal, o posicionamento foi no sentido de admitir a incidência de imposto sobre os ingressos vendidos aos frequentadores dos hipódromos, mas não sobre a renda das apostas. Os precedentes são da década de 80, enquanto a situação atual é nova e com novos desdobramentos.
O resultado interessa a outras prefeituras e pode significar um caminho a ser trilhado pela corte em relação ao mercado de apostas no Brasil – principalmente apostas online, em que os frequentadores por óbvio não frequentam e pagam ingresso pelo local físico.
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RE 634.764